Diferentemente da maioria dos jogos competitivos populares hoje em dia, os jogos de luta traçam a sua origem lá nos arcades (ou fliperamas) da década de 80 e 90. Se posicionar em pé para jogar, ou em bancos altos de bar, e dividir um apoio menor que uma mesa de centro com outro jogador, cinzeiros e outras bugigangas colocadas entre os manches e botões não parece ser a maneira mais confortável de se disputar uma competição, mas naquela época era o que existia, e com a distância ainda grande entre os consoles domésticos e as máquinas comerciais, para muitos a “verdadeira experiência” de jogar jogos de luta envolvia cheiro de cigarro, chacoalhões no gabinete, discussões “acaloradas”, cotoveladas e outras práticas extra-jogo.
Essa origem fez com que mesmo hoje em dia, quando os consoles são considerados o padrão para as partidas, nos procuramos replicar esse “feeling arcadeano” quando jogamos, e isso se reflete nos torneios. Mas assim como muitos de nós fomos apresentados aos jogos de luta dessa forma, no Japão há muito tempo que os arcades são ambientes mais “frios”, onde cada jogador possui sua própria bancada, com seu manche, seus botões e até a sua tela, propiciando uma experiência muito mais individual. Mas com as competições de jogos de luta atingindo a dimensão atual, debates estão sendo feitos sobre qual é a melhor configuração, levando em conta o bem estar do jogadores e a competitividade.
Sega e seus dois tipos de gabinete: Astro City e Versus City. Qual é o melhor competitivamente?
Motivados pelas mudanças na edição de 2015 da Capcom Cup, o canal do Youtube Core-A Gaming postou um vídeo sobre esse assunto, questionando a configuração que geralmente se usa nos torneios realizados no ocidente. O vídeo tenta mostrar porque eles consideram que a configuração em que os jogadores ficam separados um do outro, tão comum nos outros assim chamado esportes eletrônicos, é melhor do ponto de vista competitivo. Entre os motivos eles citam os já comumente debatidos “escutar os botões do oponente” e até “olhar o controle do oponente” (geralmente com a visão periférica), até outros motivos como “botões falsos” e provocações, o que na visão deles atrapalharia o meta-game (conjunto de decisões que os jogadores tomam em seu cérebro e que levam às ações realizadas no jogo). De acordo com os analistas do vídeo, essa proximidade entre os jogadores geraria muito mais informações à serem bombardeadas no cérebro do jogadores além das fornecidas pelo jogo.
Um exemplo que eles utilizam para demonstrar seus argumentos é o famoso Evo Moment 37#, em que Justin Wong começa a chacoalhar o manche e apertar os botões loucamente em uma tentativa de desequilibrar mentalmente Daigo para que ele errasse o timing da sucessão de Parrys, de acordo com a própria declaração de Justin. Essa é uma das práticas, junto com outras como provocações verbais ou até físicas (como dancinhas) que remetem aos arcades ocidentais, onde realmente não existiam muitas “regras” sobre o que pode ou não fazer durante uma partida. E como dito no começo do artigo, a comunidade trouxe muita dessa “mentalidade de fliperama” para seus torneios, mentalidades que perduraram muito depois da quase extinção dos arcades deste lado do mundo.
Mas com a intenção da comunidade de jogos de luta de se profissionalizar, certas práticas começaram a ser questionadas do ponto de vista competitivo, e a nostalgia acabou sendo deixada de lado. Mesmo a palavra nostalgia acaba sendo uma coisa muito relativa nesse aspecto, já que foi apresentado que para muitos jogadores orientais, nostalgia é cada um na sua tela, e como alguns jogadores famosos já comentaram, jogar deste lado do mundo exige da parte deles adaptações nos seus estilos de jogo, como alterar o modo de apertar os botões, para diminuir o barulho (hoje em dia existem botões silenciosos para esse tipo de aplicação. Talvez para muitos de vocês isso possa parecer algo irrelevante, ou até “frescura”, mas com milhares de dólares em jogo, detalhes acabam se tornando cada vez mais relevantes
Um aspecto que não foi abordado no vídeo, mas que pode ser bem relevante para a nossa cena brasileira é o fato de que disponibilizar duas telas para cada estação em um campeonato exigiria um gasto que muitos torneios menores não tem condições de arcar, e até em torneios maiores poderia comprometer o orçamento. Duplicar as telas em cada estação muitas vezes teria como consequência a diminuição do número de estações, o que poderia estender o tempo de duração dos torneios, além de maior chance de problemas técnicos que podem ser prejudiciais apenas para um jogador, comprometendo a qualidade das partidas. Infelizmente são fatores que nós temos que levar em conta no Brasil devido ao reduzido apoio que nossa cena recebe.
Enfim, um tópico foi criado no Fórum CounterHit, e você pode debater com outros jogadores, se devemos alterar a configuração de nosso torneios para propiciar um ambiente mais “esterilizado” para nossos jogadores, ou se os jogadores devem se adaptar à essas situações que são inerentes do ambiente de competição. Incentivar o debate é sempre um bom caminho para que nossa cena cresça com qualidade!
Fonte: Eventhubs