Origens e história da rivalidade entre Capcom e SNK

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O seguinte artigo feito pelo nossos parceiros do Lolygon conta a história e rivalidade entre as duas empresas mais famosas no ramo de jogos de luta, Capcom e SNK. Esta é a primeira parte de uma série de artigos sobre o assunto, boa leitura!


É de cunho popular que CAPCOM (Capsule Computers) e SNK (Shin Nihon Kikaku) são duas, senão as maiores gigantes dos jogos de luta. As franquias Street Fighter e The King of Fighters são conhecidas globalmente, mas como que chegamos a esse ponto? Tentarei explicar como que ambas se apoiaram numa rivalidade capitalista e saudável e cresceram juntas, inclusive os motivos de eu estar mentindo nessa última frase.

A sua primeira questão provavelmente é: “Quem chegou primeiro?”. Bom, foi a SNK.

Em julho de 1978, Eikichi Kawasaki fundou a empresa após perceber o rápido crescimento e potencial do mercado de arcades (fliperamas aqui no Brasil), e com isso além de fabricar gabinetes para tal começou a desenvolver os jogos próprios após chamar uma galera sem rumo pra começar a programar. Os primeiros jogos da SNK foram Ozma Wars e Safari Rally, mas o mais notável foi Vanguard, lançado em 1981 e hoje nominado como o pai dos side-scrolling shooters como são R-Type e Fantasy Zone.

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Simpático, não?

Após o pontapé inicial, a SNK continuou investindo em joguinhos de arcade e começou a portá-los aos consoles da terceira geração (NES, Master System, Atari7800), iniciando assim a onda de “videogames caseiros”. Desde o início da empresa consegue se notar que Kawasaki focou em qualidade sobre quantidade, tanto que a empresa só lança 23 joguinhos até 1986, e no miolo dessa época cria Athena e Ikari Warriors, duas obras de suma importância para a SNK – Ikari Warriors foi tão notório que fora portado para oito consoles diferentes e ganhou duas sequências.

“Mas onde estava a CAPCOM nessa hora?”.

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Já não é tão simpático

Em maio de 1979 foram fundadas a I.R.M Corporation e sua subsidiária Japan Capsule Computers Co. Ltd., ambas direcionadas para a manufatura de eletrônicos para jogos (de azar). Em junho de 1983 a CAPCOM Co. Ltd. finalmente é estabelecida com a função de cuidar do departamento de vendas internas, e é aí que o seu nome começa a aparecer. Kenzo Tsujimoto (vide foto) era o capitão da empresa, numa sacada de mestre apareceu pouco nos arcades japoneses para já cair de cabeça logo em seguida no ramo dos consoles, tanto que foram pouquíssimos jogos lançados primariamente em arcades – a CAPCOM entrou no mundo das fichas de vez em 1984 com Vulgus, seguido de 1942, sendo os mais memoráveis Pirate Ship Higemaru (1984) e Ghosts ‘n Goblins (1985).

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É rapaz, e pensar que a CAPCOM deu chão pra essa lenda do SNES

Sabendo disso, existem umas coincidências bem engraçadas se você parar pra pensar. Começando pelos jogos iconicamente similares, nós temos Commando (1985) da CAPCOM e Ikari Warriors da SNK lançados, respectivamente. A punchline é que a SNK saiu ganhando nessa pois Commando ficou bem debaixo dos panos pro sucesso de Ikari Warriors; dá-se mérito ao Kawasaki e o restante dos game designers por refinar os projéteis de seu “antecessor” (em Ikari Warriors os tiros vão direto aos inimigos caso a sua mira original em uma das 8 direções esteja próxima dos mesmos).

Entretanto um dia é da caça e outro é do caçador…

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É bem fácil imaginar ambos os presidentes nessa imagem

A primeira empresa a chegar no ocidente para espalhar a cultura dos arcades foi a SNK em outubro de 1981, estabelecendo a SNK Corporation of America, porém aí que o mercado dá a primeira rasteira no Kawasaki: em 1983 aconteceu o Choque Atari ou “Falência dos Videogames de 83”, onde tanto consoles como jogos excessivos saturaram o mercado com produtos de péssima qualidade ou clones/cópias piratas (por exemplo o Coleco Gemini era um clone do Atari 2600), derrubando os valores em 97%. A SNK entrou na América do Norte no período de festa para dois anos depois sofrer desinteresse do mercado, contudo ainda lutou firme, se manteve de pé até passar a maré e fechou negócios com a Nintendo que foi sagaz e soltou o Nintendinho (NES) nos EUA em 1985.
Agora que fica interessante: Tsujimoto teve a sorte de fundar a CAPCOM apenas em 83, logo quando a crise estoura e conseguiu ficar quieto no Japão juntando fundos e fazendo pesquisa tecnológica e assim que a SNK passou o perrengue até 85, vai lá e funda a CAPCOM U.S.A. Inc., que trabalharia na distribuição de arcades e jogos para consoles, patinando sobre todo o suor e lágrimas que John Rowe, CEO da SNK of America na época, derramou para criar a cena de arcades e jogos japoneses no ocidente.

Logo em seguida Tsujimoto segue em frente com os seus pivôs Takashi Nishiyama e Hiroshi Matsumoto, diretor e game designer, respectivamente, de nada mais nada menos que Street Fighter, lançado para os arcades em 30 de agosto 1987. Street Fighter como muitos sabem é o molde para o gênero de jogos de luta, principalmente com a invenção de golpes especiais através de inputs em cadeia específicos (baixo frente soco) e foi o primeiro jogo no formato head-2-head, mais de três variações de ataques e com o sistema de “Here Comes a New Challenger!”.

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Mas que boxart horrenda

Não sendo suficiente, a CAPCOM ainda meteu bala nos consoles de vez com Megaman (ou Rockman) no mesmo ano, idealizado pelo diretor Akira Kitamura e posto em prática de forma genial pelo então artista Keiji Inafune (esse que também trabalhou em Street Fighter como ilustrador, o Adon mesmo ele fez inteiro). Através do que ele denomina “character design reverso”, Inafune projeta lindamente seu senso de movimento e destaque visual em apenas 52 cores, fazendo de Megaman um dos jogos mais limpos feitos na história e com isso o torna em um jogo acessível, trazendo devolta o charme para os videogames caseiros.

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CAPCOM USA não tinha bons artistas

Street Fighter foi grande. Não tão grande quanto seu sucessor, claro, mesmo assim ainda teve sua marca na história dos videogames e a SNK percebeu isso e não podia deixar barato.

Em julho de 1988 Tsujimoto como sempre sagaz em investimentos tecnológicos mandou pro mundo a placa CPS-1, uma espécie de “placa-mãe de arcades”, onde facilitava e barateava a revenda de jogos para gabinetes de arcade pelo simples fato de aplicarem o sistema de “cartucho” (transformou o esquema do NES em algo pronto para fliperamas). Os donos de game centers adoraram a placa porque ela facilitava muito o setup: ao invés de ter que trocar todo o aparato interno bastava colocar outro cartucho e fim. Muitas franquias glorificadas começaram nessa placa: Strider, Captain Commando e Final Fight, dando popularidade ao sistema e segurando as pontas contra a rival.

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Joguei muito dos três, recomendo visitá-los

Só que nesse mesmo ano, Kawasaki observou os movimentos de seu rival e decidiu aprimorá-los. Um pouco mais de pesquisa e tudo mais para em 26 de abril de 1990 a SNK mandar para o mercado a Neo-Geo Multi Video System ou simplesmente NeoGeo MVS. Qual era a vantagem dessa placa ao invés da CPS-1? Bem, ela poderia suportar de dois até seis jogos simultaneamente sem a necessidade de ficar abrindo o gabinete e isso era fantástico. Todo técnico de game center da época se apaixonou à primeira vista pelo sistema pois economizava muito espaço físico, só mexia uns palitos pra trocar o jogo, mudar a adesivagem do gabinete e pronto, um arcade de outro jogo sem precisar mexer na parafernalha técnica.
E não parou aí, num ato análogo a vingança, na mesma data saiu também o Neo-Geo AES (Advanced Entertainment System) que era basicamente um console da SNK; o primeiro de muitos. Primeiramente ele era vendido apenas para hotéis e comércios para as pessoas passarem o tempo, aconteceu que Kawasaki percebeu que as pessoas estavam dispostas a pagar para levar um AES pra casa, então começou a vendê-lo pro povão em 1991, o problema é que era caro demais – US$600.00 que hoje dá US$954.55 (R$3.340,00 na cotação atual) – daí decidiu dar uma baixadinha pra US$400.00 e começou a sair razoavelmente; foi um console bem famoso entre aficcionados por jogos de luta e uma plataforma dos primeiros passos da SNK.

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Além de bonitinho é confortável

Tanto a CPS-1 como a MVS começaram a se encarar nas pistas de jogatina da juventude em terras americanas, o problema é que houve uma interferência que nem Tsujimoto nem Kawasaki se precaveram contra tomou conta de seus produtos: malandragem. O pessoal começou a piratear os cartuchos da CAPCOM e da SNK e vender a preço de banana e, claro, quem não quer cortar gastos? Afinal cada jogo da CAPCOM saía em volta de US$600.00 e os da SNK perto de US$350.00. Por esse motivo, coisas assim aconteciam:

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E foi assim que nasceu o M.U.G.E.N

O impressionante é que esse episódio teve seu lado positivo: muitos dos conceitos contemporâneos podem e não podem ter aparecido em bootlegs de Street Fighter II, até porque existem tantos bootlegs quanto estrelas no universo e ninguém nunca vai conseguir registrar todos eles – obrigado China!

Uma observação importante é que é dessa malandragem capitalista que vem a cultura da “mentira de fliperama” que muitos de nós presenciamos na infância. O Brasil foi um dos países que mais importaram cartuchos piratas então muitos de nós jogamos versões modificadas, logo falas como “Tem como fazer o Hadouken do Ryu seguir a pessoa” ou “Eu já consegui dar 3 Shoryukens seguidos” nunca deixaram de ser verdade, só não eram “verdade”.

Como puderam ver, a primeira década de ambas corporações foram bem conturbados. No geral é fácil de notar que a SNK aposta muito mais que a CAPCOM e isso se prova uma dádiva por uma década assim como uma maldição em um momento em especial mas chega por hoje, já falei demais.

O próximo episódio dessa série já vai começar com o ponto de explosão dos anos 90.
Qual é?
Eu não preciso nem dizer né.

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Fonte: Lolygon

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